Já era adulta e mãe três filhas
e meia quando se deu o 25 de Abril. Vivi, pois, muitos anos numa ditadura. Hoje
vivo numa série de ditaduras.
É a ditadura do politicamente
correcto de que já estou cansada.
É a ditadura da prática
discursiva sexista. Houve uma alma lunática que alvitrou que dizer cidadãos era
uma prática discursiva sexista. E começaram os políticos a falar em cidadão e
cidadã, trabalhador e trabalhadora, português e portuguesa, todos e todas… Eu,
que sou mulher, continuarei a dizer portugueses para todos os naturais de
Portugal. E, para quem aderiu a esta palhaçada, pergunto se dizer sempre em
primeiro lugar o plural masculino, e só depois o feminino, não será também uma
prática discursiva sexista.
É a ditadura dos antirracistas.
Se um bairro é habitado por pretos, sejam eles de onde forem, por que não é
aceite falar no bairro de pretos. É apenas uma constatação; não é pejorativo.
Se disserem que o meu prédio é de brancos, só estão a constatar uma realidade.
Não estão a insultar nenhum dos habitantes do meu prédio.
É a ditadura dos animais. Os
animais devem ser bem tratados como animais, não devem ser tratados como
pessoas que não são. Não são “o bebé”, “o menino”, “o filho”… São o animal lá
de casa, de quem todos gostam.
É a ditadura dos ciganos. Se
alguém disser que, genericamente, os ciganos vivem de subsídios é apenas uma constatação,
mas essa pessoa é logo insultada. Os
ciganos, genericamente, não têm um trabalho fixo. Isso não faz deles nem mais
nem menos que os brancos. Todos devem ser tratados como seres humanos.
Respeitados quando se dão ao respeito e punidos se a situação o justificar,
como qualquer cidadão.
É a ditadura dos LBGT. Discordar
das paradas do orgulho LGBTI já é motivo para se chamar nomes a alguém. A
orientação sexual de cada um é um assunto que só ao próprio diz respeito, mas é
uma decisão do próprio; não é para exibir. Ou bem que querem ser iguais, ou bem
que querem exibir-se.
É a ditadura da extrema esquerda.
Se ninguém se insurge contra a extrema esquerda, por que se ostraciza quem acha
legítimo haver extrema direita? Onde fica a liberdade quando se proíbem
partidos de extrema direita?
É a ditadura do nacionalismo
que, segundo o dicionário, é o mesmo que patriotismo. Um partido que advoga o
patriotismo é olhado como fascista, de extrema direita, …
Não é politicamente correcto ser
honesto e a ganância para conquistar votos leva os partidos a mentir aos
eleitores particularmente nas campanhas eleitorais. A radicalização
esquerda-direita tornou-se, lamentavelmente, um Benfica-Porto. Passou a ser
criminoso um partido da chamada esquerda concordar com algo vindo da chamada
direita e vice-versa. Isso inviabiliza qualquer reforma estrutural.
Vivemos não numa ditadura, mas
numa série delas e aquilo que é importante fica para as calendas. Temos um
nível de corrupção assustador perante a
passividade dos políticos; uma justiça que é célere com quem rouba 5 euros de
gasolina mas deixa prescrever quando se cometem os grandes roubos; uma educação
onde os professores deixaram de ser professores para serem burocratas a quem
dão um tempinho para dar umas aulas; uma saúde onde faltam médicos e
enfermeiros e os que há estão profundamente desmotivados e uma comunicação social
que levanta as “ondas” mas deixa que o tempo as esqueça. A única classe
política satisfeita é a dos políticos.
O Estado não nos deixa ser
livres. Estamos numa confusão de ditaduras onde até o inofensivo piropo já é
crime.
Não é este o Portugal que eu
esperava deixar aos meus netos.
Por favor, deixem-nos viver!