Aqui fica novamente a crónica que tem mais de dez anos.
CALOIROS
DO MEU PAÍS !
No
ano passado houve vários caloiros que se queixaram dos “maus tratos” de que
foram alvo. A primeira a ter direito a notícias de destaque foi a aluna da
Escola Superior de Saúde de Macedo de Cavaleiros. A aluna queixou-se e fez ela
muito bem. Teria feito ainda melhor se se tivesse recusado a participar nas
idiotices. Mas, se assim fosse, este problema não teria chegado ao conhecimento
de todos nós. Na altura um jovem da comissão de praxes do Instituto teve tempo
de antena na televisão. Só perdeu por ter aberto a boca. E que não pense que os
que o ouviram são parvos. Claro que considerou tudo natural e inocente e,
quando lhe perguntaram se a aluna sofria sanções se se recusasse a ser praxada,
ele respondeu com um categórico não. Mas acrescentou que apenas ficaria
impedida de participar em actividades académicas. Então quem se recusa a
colaborar nestas tristes cenas é penalizado?!
Quem são estes galfarros para punir um(a) colega? Com este caso gerou-se
uma polémica que durou meses. Foram trocados “mimos” entre a direcção do
Instituto Piaget de Macedo de Cavaleiros e o Ministro Pedro Lynce. Todos
garantiram que o sucedido ia ser averiguado e os responsáveis punidos.
Prometeu-se “ir até às ultimas consequências”. Quais foram? Que aconteceu aos
praxistas que ultrapassaram o limite do aceitável? Como conheço o meu país e os
seus habitantes, presumo que tudo tenha ficado por aí mesmo. Daí a minha
preocupação ao ver aproximar-se, novamente, a altura das “praxices".
Em Agosto foi
veiculado pela comunicação social que um despacho assinado pelo ministro da
Ciência e Ensino Superior autorizou a colocação de uma aluna, que se queixou de
abusos praxistas, para outra instituição do ensino superior. Mais. No caso de a
instituição não ter vagas para recebê-la, o ministério autorizou a criação de
um lugar adicional já que “existe fundamento para que seja atribuído um
tratamento excepcional”. Ou seja, quem agiu mal fica na maior e quem foi vítima
muda-se. É este o país que temos... É esta a maneira de actuar do Senhor
Ministro da Educação...
Em Janeiro deste ano Pedro Lynce prometeu
legislar sobre as praxes. Mas entre o que os políticos prometem e o que fazem
vão muitos milhões de anos-luz. Daí que eu não fique minimamente admirada de
nada ter sido feito. Aliás houve denúncias relativamente a abusos nas praxes
entre 1997 e 2000 que, pura e simplesmente, foram arquivadas. Por outro lado,
os responsáveis dos estabelecimentos do ensino superior também, tanto quanto
sei, nada fazem. Excepção feita ao Instituto Politécnico de Leiria que criou o
provedor do caloiro. É muito pouco mas é melhor que nada. E, neste país, já não
é mau pensarmos em termos de “é melhor que nada”. Gostava de conhecer as
propostas que apresentaram o Conselho de Reitores das Universidades
Portuguesas, o Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos e a Associação
Portuguesa de Ensino Superior Particular para o regime disciplinar para os
alunos do ensino superior.
Daí
que o meu apelo se dirija àqueles em quem ainda posso (quero poder...) confiar.
Jovens caloiros do meu país! Vocês não podem viver a vida sem lutar. Contestem
desde que com argumentos válidos. Não vão em carneiradas. Não fiquem calados
quando a razão está do vosso lado. Não temam ser diferentes. Não temam dizer
não a todo e qualquer tipo de humilhação. Denunciem tudo o que considerem ser
um abuso por parte dos praxistas. Os mais velhos só têm mais do que vocês uma
coisa – a idade. E mais idade, infelizmente, nem sempre corresponde a mais
responsabilidade. Lembrem-se da Sophia de Mello Breyner que diz “Porque os
outros se calam mas tu não”.
Jovens
caloiros do meu país! O Dr. Pacheco Pereira escreveu há tempos, a propósito das
praxes, que “cada vez mais a única coisa que os estudantes transportam do liceu
para a universidade é a sua carga de ignorância”. Embora eu esteja tentada a
concordar com ele, peço-vos que me ajudem a provar que tal afirmação não é
correcta. Conto convosco.