sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Obrigada Senhor Primeiro-ministro

Obrigada Senhor Primeiro-ministro por ter criado as condições para termos passado um Natal com sol.
Obrigada Senhor Primeiro-ministro por ter criado as condições para que a prestação da minha casa vá baixar.
Obrigada Senhor Primeiro-ministro por ter criado as condições para nem todos tenham passado o Natal com gripes ou viroses.
Obrigada Senhor Primeiro-ministro por ter criado as condições para que, apesar da tosse, eu tenha podido fazer as rabanadas e os sonhos.
Obrigada por tudo, Senhor Primeiro-ministro. Que Deus faça por si o que o Senhor tem feito pelos portugueses. Principalmente pela educação dos portugueses.

Era uma vez…

- Meninos, Vamos a comer a sopa! – ordena a mãe
- Mas a sopa está estragada, dizem os filhos
- Mas quem manda aqui sou eu. Por isso, comam a sopa.
- Mas a sopa não se pode comer como está.
- O pai e eu já vos mandámos comer a sopa.
A mãe e o pai acabaram por provar a sopa e verificaram que estava efectivamente estragada. Mas já tinham dado ordem para comer a sopa e assumir que estavam errados ao mandar os filhos comer uma sopa que tinha azedado, era, para eles, perder autoridade e isso nunca. Quem mandava ali eram eles. Eles eram os ditadores.
- Realmente a sopa não presta e amanhã faço uma sopa boa mas só a comem se comerem a estragada hoje.
- Mas nós não queremos comer esta sopa estragada.
- Então vamos pôr um pouco de mel na sopa para tirar o gosto do azedo.
- Mas esta sopa vai fazer-nos mal.
- Paciência. Ponham também um bocadinho de caril na sopa que passa a ter outro sabor.
- Mas nós não conseguimos comer esta sopa.
- Quem comer esta sopa, depois come um assado, feito agora, que está uma maravilha.
- Mas nós não comemos esta sopa estragada.
- Quem comer a sopa, pode comer depois um prato de mousse de chocolate.
- Mas esta sopa está intragável.
- A sopa está estragada mas deixar de comer a sopa está fora de questão. O pai e eu já mandámos comer esta sopa e quem manda aqui somos nós. Não esqueçam isso.
- Nós não vamos comer uma sopa que já todos vimos que está estragada. – reclamam os filhos.
- Quem comer esta sopa, amanhã tem direito a um gelado.

(a história está neste pé… não sei como acaba…)
Mãe – Maria de Lurdes Rodrigues
Pai – Sócrates
Filhos - Professores

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Carta Aberta à Ministra da Educação

Excelentíssima Senhora Ministra da Educação

Ao fim de três décadas e meia de docência, as políticas educativas do Governo do meu país levaram-me a pedir a aposentação antecipada e com penalização. Fugi da escola pública de hoje. A escola do facilitismo, da mediocridade, da desautorização dos professores, da desumanização, da irresponsabilidade, das estatísticas, da entrega dos deveres aos professores e dos direitos aos alunos,… Não foi para esta escola que dei tantos anos da minha vida. Nem foi assim que pensei terminar uma longa carreira de que gostei muito.
De Amarante a Matosinhos passando por Lisboa, Figueira da Foz, Porto, Espinho, Bragança, Marco de Canavezes, Vila Real, Barcelinhos, Penafiel, Famalicão e S. Pedro da Cova, ajudei a formar milhares de jovens. Foram muitos quilómetros percorridos quando não havia uma única auto-estrada. Mais do que uma vez tive que me sujeitar a ver as minhas três filhas pequeninas apenas aos fins-de-semana para ir, para longe, ensinar os filhos dos outros. Sem nada que me ajudasse a suportar as despesas. Tudo isto fiz com muito sacrifício mas muito gosto. Durante anos e anos amei o que fiz.
Para minha actualização frequentei mais de 50 acções de formação/seminários quer na área de informática, quer na minha área específica.
Fui Directora de Instalações, Representante de Disciplina, Delegada de Grupo, Directora de Turma, Vice-presidente do Conselho Executivo, Presidente do Conselho Administrativo, Representante de Área Disciplinar, Coordenadora de Departamento, Responsável pela Sala de Estudo, Presidente da Assembleia de Escola.
Leccionei todos os níveis de ensino desde o 5º ao 12º ano.
Orgulho-me do trabalho que sempre desenvolvi apesar do desânimo aumentar ano após ano. Nunca aspirei aos prémios que o Ministério atribui anualmente. Os meus prémios são as mensagens que recebo dos meus ex-alunos.
“Boa tarde professora, Não sei se ainda tem esta conta de email activa, mas espero que sim. Eu sou o seu antigo aluno Eduardo …, fui seu aluno de química no ano lectivo de 2004/2005, não sei se ainda se lembra de mim. Eu estou a acabar o meu curso na faculdade, estou já no ultimo ano e sou finalista, como tal, temos a tradição de assinar as fitas e eu gostava que a professora me assinasse a fita, uma vez que a considero a melhor professora que tive até hoje, pois sempre acreditou em mim e fez todos os possíveis para me ensinar, não só a matéria correspondente a sua disciplina, mas também a ser um homem decente. Para além de excelente professora, foi também uma grande amiga, que é algo que muitos professores não são e por isso gostava que me desse a honra de me assinar a fita. A minha queima das fitas é já esta semana e tenho de ter as fitas no dia 27, por isso peço resposta a este email o mais rápido possível, caso a professora não possa assinar-me as fitas antes dessa data, não há problema, assina depois pois o que conta para mim é que a fita seja assinada, independentemente da data. Gostava também de lhe pedir um favor…
Peço desculpa pelo incómodo e espero atentamente uma resposta.
Beijos e abraços, do seu antigo aluno e amigo,
Eduardo …”

Ou como esta recebida há dias quando chegou a minha aposentação.
“Soube ontem ao último tempo que a professora tinha recebido a carta da reforma. Vou ser sincero, fiquei muito triste por perder uma das melhores professoras de sempre.Paciente, simpática, honesta, humilde.... são muitas das características que a professora tem.A escola perdeu uma das melhores professoras ao serviço.Pessoalmente n estou triste por perder uma professora mas sim estou triste por ter perdido uma grande amiga que me ajudou sempre.Toda a turma ficou um bocado triste (embora querendo disfarçar através de sorrisos e risos), pois tem a consciência que vai ser difícil substituir uma professora como a s'tora.Diz-se que ninguém é insubstituível, mas a professora é das poucas pessoas que não podem substituídas por nada deste mundo.Aqui está á minha despedida muito humilde, não é que desejaria dar á professora pois o que lhe queria dar está para além dos meus alcances.Só deixo votos de felicidade e desejos que um dia nos voltemos a encontrar.Muitos beijos e abraços:Bruno …”
Pelos Eduardos, pelos Brunos e por todos os alunos que já me passaram pelas mãos, e que me atribuíram “medalhas”, aguentei enquanto pude. Agora, acabou.
Numa quinta-feira de Novembro fui chamada para uma substituição. Não havia plano de aula. A professora em causa tinha acabado de receber a sua aposentação antecipada e com penalização. Uma professora que já estava na escola quando para lá fui e eu estive lá 20 anos. Dirigi-me à sala de aula. Estavam os (talvez) 28 alunos de uma turma do 7º ano que não conhecia. Muitos choravam e diziam "A Professora M. era nossa amiga. Ensinava bem e ajudava-nos muito".

Estes alunos só conheciam esta professora desde meados de Setembro.Em contraste com isto, a professora estava num sino. Irradiava felicidade e até as lágrimas lhe vieram aos olhos de tanta alegria. Finalmente estava livre do inferno que se vive hoje nas escolas. Analisando esta situação, só se pode concluir que algo está errado. Uma pessoa que dedicou uma vida ao ensino, uma professora de quem os alunos gostam ao ponto de chorar a sua saída, abandona a profissão de uma vida sem tristeza e com penalização na sua reforma. A debandada é geral e os que estão a sair são os mais experientes.
Vi e ouvi, com tristeza e uma revolta imensa, as posições inqualificáveis de membros do Governo perante a manifestação de 85% dos docentes do meu país. Não consigo aceitar que me apelidem de chantagista com uma leviandade sem nome. Não sou sindicalizada nem filiada em nenhum partido. Sempre pensei pela minha cabeça, disse o que penso, escrevi o que disse e assumi o que escrevo. Durante anos escrevi uma crónica mensal num semanário e insurgi-me contra a avaliação em vigor na altura. Realmente tinha que ser substituída. Mas por uma melhor, o que não é o caso. A mobilização que se conseguiu em Março e em Novembro não foi conseguida pelos sindicatos. Eles não têm capacidade para tal. A internet e o telemóvel são hoje os melhores meios de mobilização. A Senhora Ministra conseguiu, pela primeira vez, unir os professores e pô-los em contacto permanente uns com os outros.
O dia a dia de um professor é inimaginável por quem não o vive, como é o caso da Senhora Ministra. Pede-se aos professores que sejam, para além de transmissores de conhecimentos, mães, pais, psicólogos, assistentes sociais, amigos, ...
“Os professores têm, cada vez mais, à sua frente um conjunto de órfãos de pais vivos.” – uma verdade que li aqui há tempos.
Mas pede-se mais. Pede-se aos professores que apliquem um ensino individualizado a turmas com 28 alunos num número de aulas que não chega para leccionar os conteúdos programáticos estupidamente extensos. Pede-se o impossível. “Dar aulas, de facto, é tão simples como falar trinta e cinco línguas ao mesmo tempo ou cantar sozinho uma partitura para trinta e cinco vozes”. (Bernard Houot)
Para esta super-escola eram precisos super-homens e super-mulheres e isso só existe na banda desenhada.
“Nós somos como somos, com altos e baixos. Com momentos de entusiasmo e momentos de quebra. Com rasgos de génio e sombras travessias do deserto. E ninguém poderá nunca tornar-nos perfeitos. Se nos pedem para sermos perfeitos é, pois, abusivamente porque o sistema que se encontra acima de nós não o é.” (Bernard Houot)
Que posso eu exigir de um aluno que vive com uma mãe com problemas mentais que lhe diz que o odeia e que o quer matar? E de uma jovem que chega às aulas da tarde sem ter comido absolutamente nada? E de uma jovem que vive, a meias com a mãe, com outro homem que não o pai? E de uma criança que dorme na sala e só pode descansar quando os pais resolvem deitar-se? E da jovem que fica a trabalhar no café dos pais até às tantas da madrugada? E poderia ficar aqui um tempo infindo a pôr a nu as situações com que os professores se debatem. Esta é a escola real. Uma escola cheia de problemas cuja resolução compete ao Estado mas com os quais os professores vivem diariamente. Estes jovens não podem ter o rendimento desejável mas, pressionar o professor a passá-los, não lhes resolve os seus problemas. Como não lhes resolve os seus problemas um computador oferecido pelo Governo. Ou o TGV. Ou um novo aeroporto na capital. Mas quem pode manda e define as prioridades que entende. Não são as minhas e não as entendo.
Para juntar a tudo isto, a Senhora Ministra elaborou um modelo de avaliação perfeitamente inaceitável. Diz a Senhora Ministra que os professores devem confiar nos seus colegas mais competentes (refere-se aos professores titulares) mas quem lhes atribuiu essa competência foi a Senhora Ministra ao pôr em prática o mais escandaloso dos concursos – o primeiro concurso para professor titular. “Há coisa mais injusta do que uma avaliação que não premeia o mérito?” – perguntou um dia destes a Senhora Ministra. Claro que não. Mas, pergunto eu, há maior injustiça do que o primeiro concurso para professor titular? E foi com base neste concurso, eivado de injustiças e arbitrariedades, que foi construído este modelo de avaliação. Sobre alicerces podres. Por mais voltas que lhe dêem, será sempre um modelo de avaliação em que a competência estará ausente.
Para o acesso ao cargo de professor titular não era preciso ser competente em nada. Bastava ter tido muitos cargos entre 1999 e 2006. Por que razão foram escolhidos estes anos e não todo o percurso dos docentes? Só a Senhora Ministra sabe. No meu caso, professora do topo de carreira, a Senhora Ministra deitou-me, pura e simplesmente, ao lixo mais de 25 anos da minha carreira. Consegui, apesar disso, ser provida como professora titular. Por acaso, como todos, e não por mérito, como gostaria. É a isto que a Senhora Ministra chama justiça? É a isto que a Senhora Ministra chama competência? Este concurso criou nas escolas situações inaceitáveis.
Um professor com 100 pontos, numa Área Disciplinar, ascende a professor titular e, na mesma escola, outro professor com 140 pontos, numa outra Área Disciplinar, não o consegue.
Um professor do 10º escalão que tenha exercido todos os cargos possíveis numa escola antes de 1999 mas que entre 1999 e 2006 foi apenas professor, por melhor que tenha sido, não ascende a professor titular.
Um professor do oitavo escalão que, por exemplo, por não ter horário na sua Área Disciplinar, integrou um cargo no Conselho Executivo mesmo que o tenho exercido sem competência, foi provido como professor titular.
Neste momento, este último professor pode ser avaliador do anterior.
Um professor que foi orientador de estágio pode vir a ser avaliado pelo seu avaliando de estágio, desde que o segundo tenha conseguido ascender a professor titular e o primeiro não.
Mas o descalabro a que a educação chegou não se limita a estes problemas.
A Lei 3/2008 de 18 de Janeiro é uma perfeita aberração. Trata da mesma maneira um aluno que falta por doença e outro que falta porque lhe apetece. No Despacho do domingo, dia 16 de Novembro de 2008, a Senhora Ministra, mais uma vez remete as culpas para os professores quando diz “que a adaptação dos regulamentos internos das escolas ao disposto no Estatuto do Aluno nem sempre respeitou o espírito da Lei, permitindo dúvidas nos alunos e nos pais acerca das consequências das faltas justificadas designadamente por doença ou outros motivos similares.” A lei é clara pelo que não é aceitável estar no despacho “Tendo em vista clarificar os termos de aplicação do disposto no Estatuto do Aluno…”. Sejamos honestos, o Despacho altera a Lei, se é que juridicamente isso é possível.
O Programa Novas Oportunidades é outro embuste. Por aquilo que vejo, e pelas pressões das DREs para aprovar todos os alunos dos Cursos de Educação e Formação, dos Cursos Profissionais e Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências, estão a qualificar-se milhares de analfabetos. Será isto que o país precisa, Senhora Ministra?
Segundo a Senhora Ministra, a implementação das aulas de substituição, que tanta polémica gerou, hoje faz-se confortavelmente. Engano, Senhora Ministra. Os professores que conheço, e são muitos, fazem-no porque a tal são obrigados mas fazem-no sem o mínimo de conforto e com o máximo descontentamento dos alunos.
O ambiente que se vive nas escolas é de uma tensão imensa. O desalento e a desmotivação são gerais e o clima de medo está instalado. E ainda vai piorar quando aparecer a figura do director prevista na lei.
O que se fez da escola pública? Como se pode ter toda uma classe profissional desmotivada? Eu saio sem conseguir perdoar a este Governo o ter-me roubado o prazer que eu tinha em exercer a profissão que escolhi. Nestes últimos anos foi muito penoso ir trabalhar. Muito penoso, mesmo.

Maria da Graça Pimentel

9 de Dezembro de 2008

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Professores em greve

Numa crónica minha, publicada num jornal semanário em Julho de 2005, escrevi:

“Não foi com optimismo que vi ser escolhida a Dra. Maria de Lurdes Rodrigues para o Ministério da Educação. Tinha duas razões: uma objectiva e outra subjectiva. É professora do ensino superior, estando portanto a anos-luz da realidade do ensino que tutela e tem os lábios finos, estando assim no grupo de más pessoas que já cruzaram a minha vida.”

Infelizmente não me enganei. O tempo provou que esta Senhora não conhece minimamente a realidade dos estabelecimentos de ensino não superior. Em questão de maldade superou, de longe, todas as outras más pessoas que comigo se cruzaram.
Nesse ano foi marcada a greve aos exames do 12º ano. Não concordei com essa greve e não fazia tensões de aderir. Mas, nessa altura, a Ministra impediu-me de não fazer greve. Requisitou civilmente os professores para os exames. Esta não lhe perdoo. Impediu-me de não fazer greve.
Hoje faria greve sem a menor hesitação. Infelizmente já não posso. A minha aposentação antecipada e com penalização chegou. A Senhora dos lábios finos roubou-me o prazer que eu tinha em exercer a profissão que escolhi. Ao fim de 36 anos de docência vi-me forçada a sair. Esta também não lhe perdoo. A Ministra está preocupada com o abandono dos alunos; não dos professores. E a debandada é geral.
Este Governo desesperado, depois de tentar defender, de uma maneira esfarrapada, este modelo de avaliação, optou por uma persuasão agressiva. Escrever a todos os professores sensibilizando-os para esta avaliação e chamar os professores socialistas fazendo deles seus parceiros na mentalização dos seus colegas. É possível que alguns tenham sido convencidos mas a grande maioria ainda pensa pela sua cabeça. Curioso que eu recebi duas mensagens: uma da DGRHE e outra da Ministra sendo que o Outlook enviou esta última para Junk e-mail. Correcto. Publicidade. Enganosa.

A minha solidariedade para todos os professores que hoje estão em luta e de luto. Luto pela morte lenta a que este Governo votou a escola pública.

A todos os que ainda não conseguiram ver isso, o tempo provar-lhes-á que os professores estão com a razão toda.
Será tarde demais.

domingo, 30 de novembro de 2008

Competência das professores

Diz a Ministra que os professores devem confiar nos seus colegas mais competentes (refere-se aos professores titulares) mas quem lhes atribuiu essa competência foi a própria Ministra ao pôr em prática o mais escandaloso dos concursos – o primeiro concurso para professor titular. E foi com base neste concurso, eivado de injustiças e arbitrariedades, que foi construído este modelo de avaliação. Sobre alicerces podres. Por mais voltas que lhe dêem, será sempre um modelo de avaliação em que a competência estará ausente.

Para o acesso ao cargo de professor titular não era preciso ser competente em nada. Bastava ter tido muitos cargos entre 1999 e 2006. Por que razão foram escolhidos estes anos e não todo o percurso dos docentes? Só a Ministra sabe. No meu caso, professora do topo de carreira, a Ministra deitou-me, pura e simplesmente, ao lixo mais de 25 anos da minha carreira. Consegui, apesar disso, ser provida como professora titular. Por acaso, como todos, e não por mérito, como gostaria. Será aceitável que a competência seja medida por pontos adquiridos primeiramente pelo exercício, bom ou mau, de cargos? É a isto que a Ministra chama competência? Este concurso criou nas escolas situações impensáveis.

Um professor com 100 pontos, numa Área Disciplinar, ascende a professor titular e, na mesma escola, outro professor com 140 pontos, numa outra Área Disciplinar, não passa a professor titular. A medida da competência variou de escola para escola e, na mesma escola, de Área Disciplinar para Área Disciplinar.
Um professor do 10º escalão que tenha exercido todos os cargos possíveis numa escola antes de 1999 mas que entre 1999 e 2006 foi apenas professor, por melhor que tenha sido, não é professor titular.
Um professor do oitavo escalão que, por exemplo, por não ter horário na sua Área Disciplinar, integrou um cargo no Conselho Executivo mesmo que o tenho exercido sem competência, foi provido como professor titular.
Neste momento, este último professor pode ser avaliador do anterior.
Um professor que foi orientador de estágio pode vir a ser avaliado pelo seu avaliando de estágio, desde que o segundo tenha conseguido ascender a professor titular e o primeiro não.
E querem que eu considere aceitável este sistema de avaliação?

Seis meses sem democracia

A DGRHE e a Minsitra enviaram-me, no mesmo dia duas mensagens iguais.
Nada me liga a Manuela Ferreira Leite, muito pelo contrário, mas tanto alarido se fez, nomeadamente as palavras inaceitáveis de Alberto Martins, quando, afinal, os "seis meses sem democracia" já começaram.

"Exmo.(a) Senhor(a) Professor(a)

Prestam-se as seguintes informações relativamente ao processo de avaliação de desempenho dos docentes:

Um modelo de avaliação de desempenho que não prejudica nenhum professor

Com a classificação de Bom, para a qual não existem quotas, estão garantidas condições para uma normal progressão na carreira.
As classificações de Excelente e Muito Bom aceleram o ritmo da progressão.
Neste ciclo avaliativo eventuais efeitos negativos decorrentes das classificações de Insuficiente ou Regular estão suspensos e sujeitos a confirmação posterior.

Assim, este modelo protege os professores, dando-lhes condições mais vantajosas que à generalidade dos funcionários públicos, que não adquirem automaticamente condições de progressão com classificações isentas de quotas. Neste período transitório existe uma vantagem adicional para os professores, que decorre da não aplicação de efeitos das classificações negativas.

O que é, afinal, a avaliação de desempenho docente?
Este modelo de avaliação respeita a especificidade da função docente e o nível de qualificação que o seu exercício exige, ao contrário do que sucede com a larga maioria dos trabalhadores da administração pública - incluindo o pessoal não docente, que há dois anos é avaliado em todas as escolas.
É por isso que a avaliação do desempenho dos professores contempla duas vertentes e, consequentemente, é efectuada por avaliadores distintos:
- a avaliação funcional, que é assegurada pelo director ou presidente do conselho executivo e contempla dimensões inerentes ao desempenho de qualquer profissão, tais como o cumprimento dos objectivos individuais, a assiduidade, o cumprimento do serviço lectivo e não lectivo, a participação na vida da escola, entre outros.
- a avaliação científico-pedagógica, que é efectuada pelos professores coordenadores do respectivo departamento curricular ou outros professores titulares em quem tenha sido delegada a competência de avaliação, que são em regra os professores mais experientes.
Para que esta seja efectivamente uma avaliação de desempenho, e não uma análise documental baseada em registos administrativos, é fundamental, na vertente científico-pedagógica, a observação directa do desempenho em sala de aula.
É por esta razão que, embora esta vertente tenha sido tornada transitoriamente voluntária, ela permanece obrigatória para a atribuição das classificações que distinguem o mérito (Muito Bom e Excelente).

A avaliação dos professores e os resultados escolares dos alunos

Foi tomada a decisão de não considerar o parâmetro que avalia o contributo dos docentes para progresso dos resultados escolares e para a redução da taxa de abandono, na sequência, aliás, da recomendação do Conselho Científico de Avaliação de Professores, que considera a necessidade de uma maior consolidação técnica a este nível.

Esta medida decorre, fundamentalmente, da percepção de que se trata de um dos elementos de mais difícil operacionalização, dando, em muitas escolas, origem a instrumentos de registo e indicadores de medida muito complexos e induzindo uma forte carga burocrática, contribuindo, assim, para a simplificação do processo, que poderá prosseguir normalmente em todas as escolas.

Ministério da Educação"

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Saí

Eu faço parte dos professores que abandonaram.
(a imagem foi publicada não sei quando nem onde mas guardei-a no meu computador)

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Inaceitável

Agora, que uma maioria significativa de escolas aprovou uma moção pedindo a suspensão deste modelo de avaliação, a Direcção Geral dos Recursos Humanos da Educação está a enviar por correio electrónico esta "mensagem" aos professores. Esta foi enviada ontem.
Esta atitude é tanto mais condenável quanto a legislação não permite que os documentos sobre a avaliação de qualquer docente sejam do conhecimento dos técnicos da DGRHE.
Isto tem um nome mas é tão feio que nem o escrevo.

O meu endereço de correio electrónico não deve constar na DGRHE...

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Clarificar ou alterar?

Expliquem-me, como se eu fosse ministra, se o despacho de ontem vem clarificar ou alterar a lei 3. Para mim a lei 3 é clara e é alterada com o despacho.

Lei n.º 3/2008 de 18 de Janeiro
Artigo 22.º
Efeitos das faltas
1 — Verificada a existência de faltas dos alunos, a escola pode promover a aplicação da medida ou medidas correctivas previstas no artigo 26.º que se mostrem adequadas, considerando igualmente o que estiver contemplado no regulamento interno.
2 — Sempre que um aluno, independentemente da natureza das faltas, atinja um número total de faltas correspondente a três semanas no 1.º ciclo do ensino básico, ou ao triplo de tempos lectivos semanais, por disciplina, nos 2.º e 3.º ciclos no ensino básico, no ensino secundário e no ensino recorrente, ou, tratando -se, exclusivamente, de faltas injustificadas, duas semanas no 1.º ciclo do ensino básico ou o dobro de tempos lectivos semanais, por disciplina, nos restantes ciclos e níveis de ensino, deve realizar, logo que avaliados os efeitos da aplicação das medidas correctivas referidas no número anterior, uma prova de recuperação, na disciplina ou disciplinas em que ultrapassou aquele limite, competindo ao conselho pedagógico fixar os termos dessa realização.
3 — Quando o aluno não obtém aprovação na prova referida no número anterior, o conselho de turma pondera a justificação ou injustificação das faltas dadas, o período lectivo e o momento em que a realização da prova ocorreu e, sendo o caso, os resultados obtidos nas restantes disciplinas, podendo determinar:
a) O cumprimento de um plano de acompanhamento especial e a consequente realização de uma nova prova;
b) A retenção do aluno inserido no âmbito da escolaridade obrigatória ou a frequentar o ensino básico, a qual consiste na sua manutenção, no ano lectivo seguinte, no mesmo ano de escolaridade que frequenta;
c) A exclusão do aluno que se encontre fora da escolaridade obrigatória, a qual consiste na impossibilidade de esse aluno frequentar, até ao final do ano lectivo em curso, a disciplina ou disciplinas em relação às quais não obteve aprovação na referida prova.
4 — Com a aprovação do aluno na prova prevista no n.º 2 ou naquela a que se refere a alínea a) do n.º 3, o mesmo retoma o seu percurso escolar normal, sem prejuízo do que vier a ser decidido pela escola, em termos estritamente administrativos, relativamente ao número de faltas consideradas injustificadas.
5 — A não comparência do aluno à realização da prova de recuperação prevista no n.º 2 ou àquela a que se refere a sua alínea a) do n.º 3, quando não justificada através da forma prevista do n.º 4 do artigo 19.º, determina a sua retenção ou exclusão, nos termos e para os efeitos constantes nas alíneas b) ou c) do n.º 3.

Despacho de 16 de Novembro de 2008
Considerando que a adaptação dos regulamentos internos das escolas ao disposto no Estatuto do Aluno nem sempre respeitou o espírito da Lei, permitindo dúvidas nos alunos e nos pais acerca das consequências das faltas justificadas designadamente por doença ou outros motivos similares
Considerando que o regime de faltas estabelecido no Estatuto visa sobretudo criar condições para que os alunos recuperem eventuais défices de aprendizagem decorrentes das ausências à escola nos casos justificados
Tendo em vista clarificar os termos de aplicação do disposto no Estatuto do Aluno, determino o seguinte:
1 – Das faltas justificadas, designadamente por doença, não pode decorrer a aplicação de qualquer medida disciplinar correctiva ou sancionatória.
2 – A prova de recuperação a aplicar na sequência de faltas justificadas tem como objectivo exclusivamente diagnosticar as necessidades de apoio tendo em vista a recuperação de eventual défice das aprendizagens.
3 – Assim sendo, a prova de recuperação não pode ter a natureza de um exame, devendo ter um formato e um procedimento simplificado, podendo ter a forma escrita ou oral, prática ou de entrevista.
4 – A prova referida é da exclusiva responsabilidade do professor titular de turma, no primeiro ciclo, ou do professor que lecciona a disciplina em causa, nos restantes ciclos e níveis de ensino.
5 – Da prova de recuperação realizada na sequência das três semanas de faltas justificadas não pode decorrer a retenção, exclusão ou qualquer outra penalização para o aluno, apenas medidas de apoio ao estudo e à recuperação das aprendizagens, sem prejuízo da restante avaliação.
6 – As escolas devem adaptar de imediato os seus regulamentos internos ao disposto no presente despacho, competindo às Direcções Regionais de Educação a verificação deste procedimento.
7 – O presente despacho produz efeitos a partir do dia seguinte à data da sua assinatura.

sábado, 8 de novembro de 2008

A galinha dos ovos de ouro

Depois de ver 120.000 professores na rua contra uma avaliação de desempenho idiota, injusta, burocrática e geradora de conflitos inimagináveis, a Ministra veio à televisão dizer, rindo (por que se ri agora uma mulher que nunca soube rir?) dizer que procura salvaguardar os interesses públicos. E julgava eu que a aprendizagem dos alunos era um interesse público!
Disse, também, que a avaliação era para cumprir porque está na lei e as leis são para cumprir e que os avaliados devem confiar nos professores mais experientes.
Mas não disse que quem decretou quem eram os professores mais experientes foi ela com o mais escandaloso dos concursos – o concurso para professor titular. Um professor com 36 anos de serviço, com mestrado ou doutoramento pode vir a ser avaliado por um professor bacharel que entre 2000 e 2007 fez parte do Conselho Executivo. Para Maria de Lourdes Rodrigues a competência é medida pela quantidade (não qualidade) de cargos que ocupou entre 2000 e 2007. A razão por que foi escolhido entre prazo só é do conhecimento da ministra. Podemos conjecturar à vontade.
Disse, ainda, que a única coisa que se pede aos professores é que preencham uma ficha com duas páginas com os objectivos individuais. Se a mentira pagasse imposto, Portugal resolveria todos os seus problemas orçamentais com os impostos desta senhora.
O número de pedidos de aposentação de professores aumentou, em relação a 2007, 35% e muitos destes pedidos correspondem a aposentações antecipadas e com penalização. Será que isto também não significada nada?
Definitivamente esta mulher não vai lá nem com um desenho…
Repito o que já venho a dizer desde 2001. “ O ensino privado é a galinha dos ovos de ouro”.

O que fizeram da escola!

Segunda-feira, às 14:15 h fui chamada para uma substituição. Não havia plano de aula. A professora em causa tinha acabado de receber a sua aposentação antecipada e com penalização. Uma professora que já estava na escola onde lecciono quando para lá fui e eu já lá estou há 20 anos.
Dirigi-me à sala de aula. Estavam os (talvez) 28 alunos do 7º B que não conhecia. Muitos choravam e diziam "A Professora M. era nossa amiga. Ensinava bem e ajudava-nos muito".
Estes alunos só conheciam esta professora desde meados de Setembro.
Em contrate com isto, a professora estava num sino. Irradiava felicidade e até as lágrimas lhe vieram aos olhos de tanta alegria. Finalmente estava livre do inferno que se vive hoje nas escolas.
Analisando esta situação, só se pode concluir que algo está mal. Uma pessoa que dedicou uma vida ao ensino, uma professora de quem os alunos gostam ao ponto de chorar a sua saída abandona a profissão de uma vida sem tristeza e com penalização na sua reforma.
Como foi possível deixar que estas situações acontecessem? A debandada é geral.
Eu também espero, mais dia menos dia, a aposentação que pedi, também antecipada e também com penalização. Dediquei 36 anos da minha aos jovens e às escolas por onde andei. Nunca pensei "fugir" antes do tempo. Mas tenho andado a assistir às exéquias do ensino público. Quando chegar o funeral, desculpem, eu não quero estar lá.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Patético

“Todos os meus assessores usam este computador (Magalhães) porque não precisam de outro.” - palavras de José Sócrates.

Estas palavras lembraram-me um poema de António Gedeão.

Estatística

Quando eu nasci havia em Portugal
(em Portugal continental
e nas ridentes,
verdes e calmas
ilhas adjacentes)
uns seis milhões e umas tantas mil almas.
Assim se lia no meu livrinho de Corografia
de António Eusébio de Morais Soajos.
Hoje, graças aos progressos da Higiene e da Pedagogia,
já somos quase dez milhões de gajos.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Pau de giz

No Pau de giz vou começar a transcrever pedaços de crónicas minhas publicadas há anos. Aproveito para relembrar e ver que o país onde tive a desdita de nascer não consegue mesmo progredir.

Hoje deixo aqui um pouco de "Ler, escrever e contar" publicada em Março de 2001.

"Todos acompanhámos as eleições americanas. Depois de semanas e semanas a contar, recontar e passar à lupa os boletins de voto, Bush lá chegou à presidência dos Estados Unidos da América. E, para começar, colocou no topo da agenda a educação. Elegeu-a como a sua paixão. (Onde é que eu já ouvi isto?). Pelos vistos Bush chegou à conclusão que a educação não está lá grande coisa. Acontece aos melhores. Mas o presidente é realista. Quer começar pelo princípio, com pequenos passos e propostas viáveis. Começar pelos mais pequeninos. Começar por baixo. Faz ele muito bem. A única coisa onde se começa por cima é a abrir buracos, sempre ouvi dizer desde miúda. Quer, então, o presidente que, dentro de quatro anos, todas as crianças saibam ler, escrever e contar quando completarem nove anos. Era exactamente o que nós devíamos querer. Quer, e muito bem, avaliar as escolas. É assim que deve ser. Exigir. Desde que sejam dadas as condições para tal. Quem não cumpre, deve ser penalizado por isso. Não se deve deixar impune quem não faz aquilo que é sua obrigação fazer. A todos os níveis.

A proposta feita por Bush foi aceite por democratas e republicanos. Ou seja, todos concordam que o ensino não vai bem e todos querem melhorar as coisas. Governo e oposição põem de parte as partidarices políticas para, conjuntamente, resolverem um problema que afecta todos os jovens que serão os homens e mulheres de amanhã. Por cá, quando um Governo, tenha ele a cor que tiver, faz uma proposta, só tem como certa uma coisa. A divergência da oposição. Qualquer que seja a proposta.


Querer que as crianças com 9 anos saibam ler, escrever e contar é querer na medida certa. Algo que podia muito bem ser copiado por nós. Aliás, nós já tivemos isso por cá. Já lá vai o tempo em que, com a quarta classe, se sabia ler, escrever e contar. Até se sabia muito mais do que isso. Nem tudo estaria bem nessa altura. Saber de cor as paragens e apeadeiros da linha do Norte ou da Beira Alta, convenhamos, que não tem grande interesse. Mas também tinha a vantagem de se ficar a saber que o Entroncamento não fica em Trás-os-Montes. E não me consta que haja gente traumatizada por ter aprendido, na instrução primária, a ler, escrever e contar como deve ser. Depois, uns iluminados chegaram à conclusão que as criancinhas de hoje não são feitas da mesma massa que eram as de algumas dezenas de anos atrás. Tudo as traumatiza. A talho de foice, conto aqui uma história de que tomei conhecimento há dias. Uma mãe, preocupada com a péssima caligrafia do filho, mal de que padece a grande maioria dos alunos, sugeriu à professora do 1º ciclo que pusesse os alunos a escrever em cadernos de linhas. A professora, escandalizada, argumentou que isso iria restringir a criatividade dos alunos. Bons tempos em havia caligrafia. Em que um a era um a ou um o era um o para toda a gente; em que um a minúsculo não era um A maiúsculo pequenino. Chegámos a isto. Os alunos completam o nono ano sem saber ler, escrever e contar. Mas o que se quer, de há muito tempo a esta parte, é que toda a gente tenha a escolaridade obrigatória. Mesmo que não saiba nada de nada. Em termos estatísticos, para consumo interno, isso conta muito.

..."

domingo, 26 de outubro de 2008

O computador do MST

Não sei onde está o computador do Miguel Sousa Tavares mas dava tudo para o ter na minha mão. Acho que uma vida inteira dedicada à educação merecia o gozo de poder dizer ao dito senhor que o seu computador estava nas mãos de uma professora que faz parte dos “inúteis mais bem pagos do país”, como ele disse. (aquele ódio visceral à classe docente já raia o patológico)
Dir-lhe-ia, ainda, que não queria mais nada dele em troca da pequena máquina, como ele pediu. Exigiria, somente, desse senhor um pedido público de desculpas a todos os professores a ser veiculado através de todos, mas todos mesmo, os órgãos de comunicação social.
Pena não poder oferecer-me esse prazer…

Onde anda a democracia?

Conheci Carlos Paiva ontem no lançamento do seu livro. Este professor escreveu “O Ensino Básico vai de mal a pior – uma abordagem pedagógica e política”. Para promover a sua apresentação e para o lançamento solicitou, por escrito, a uma escola pública do Concelho de Matosinhos, onde se lecciona o ensino básico, o aluguer do Pavilhão Polivalente da Escola. O Conselho Executivo informou, também por escrito, da impossibilidade de aluguer do referido Pavilhão sem dar qualquer justificação, tendo verbalmente considerado tal sessão como inconveniente e desadequada. O autor do livro solicitou mais esclarecimentos que não obteve.
Curiosamente essa mesma escola já, há tempos, permitiu o lançamento do livro de uma colega nas suas instalações.

A mulher de Carlos Paiva que, como eu, é professora dessa escola foi a outra escola do Concelho de Matosinhos pedir para deixar uns pequenos marcadores com a divulgação da sessão de lançamento do livro. Depois de muita persistência, um elemento do Conselho Executivo permitiu que esses inofensivos marcadores fossem colocados na sala dos professores. Contudo, o Vice-presidente da mesma escola, chamou a atenção da colega pelo facto de ter ousado entrar na sala dos professores "ainda por cima por causa disto", palavras do Vice-presidente mostrando o marcador. “Isto” era tão-somente um pedaço de papel de 5X19 cm.

Estes factos suscitam-me muita preocupação e levantam-me algumas dúvidas. Haverá Conselhos Executivos com medo? De quê? De quem? Colaborar com um colega que escreve um livro, não bajulando os responsáveis pela política educativa, comprometerá o cargo de Director que aí vem e que alguém estará interessado em ocupar? Um livro terá um poder tão grande que amedronte?

Mas isso pouco interesse tem. O que importa é que me andam a dizer que vivemos em democracia há 35 anos e eu não consigo vê-la. Ou me andam a enganar ou a graduação dos meus óculos não está correcta.

Felizmente ainda há Conselhos Executivos que sabem o que é liberdade de expressão e disponibilizam as suas instalações para o lançamento de um livro de um colega de trabalho. O da Escola Secundária Augusto Gomes, também no Concelho de Matosinhos, é um deles e merece toda a minha consideração.

sábado, 18 de outubro de 2008

Poema ao Magalhães

Chegou-me, via correio electrónico, este poema de Luís Costa, que não conheço. Achei-lhe graça e, antes de falar da famigerada acção de formação do Magalhães, deixo-o aqui.

Migalhães

Lá vem pelo avelar
O filho do Manel João
Vem do centro escolar
Cansado de palmilhar
A caminho da povoação

Não há médico na aldeia
E a antiga escola fechou
Não tem carne para a ceia
Nem petróleo para a candeia
Porque o dinheiro acabou

O seu pai foi para França
Trabalhar na construção
E a mãe desta criança
Trabalha na vizinhança
Lavando pratos e chão

Mas o puto vem contente
Com o Migalhães na mão
E passa por toda a gente
Em alegria aparente
De quem já sabe a lição

Um senhor muito invulgar
Que chegou com mais senhores
Veio para visitar
O novo centro escolar
E dar os computadores

E lá vem o Joãozinho
No seu contínuo vaivém
Calcorreando o caminho
Desesperando sozinho
À espera da sua mãe

Neste país de papões
A troco de dois vinténs
Agravam-se as disfunções
O rico ganha milhões
E o pobre Migalhães

Luís Costa

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Sala dos Professores

Há sempre quem ganhe com a desgraça dos outros.

Na avaliação de desempenho dos professores que a Ministra entendeu por em vigor com o aval dos sindicatos, que olham pelo interesse deles e não pelo de quem representam, o trabalho com os alunos na sala de aula é o que menos interessa. O que importa é que haja muitas, muitas, muitas grelhas cheias de texto, de preferência em eduquês. Como o dia dos professores é igual ao dos outros portugueses e estes "inúteis" (como lhes chama o "inútil" do Miguel Sousa Tavares) teimam em comer e dormir qualquer coisa, o tempo vai escassear para o que menos valor tem - as aulas.
Estou à vontade para falar desta avaliação porque, em primeiro lugar, já escrevi há muitos anos uma crónica sobre este tema, criticando a avaliação que estava em vigor e, em segundo lugar, porque enviei à Ministra, por escrito e aquando da discussão, a minha proposta de avaliação. Digo isto para que o Miguel Sousa Tavares, o Emídio Rangel, o Manuel Ribeiro e outros tantos que, repentinamente, se tornaram conhecedores dos problemas da educação sem nunca terem dado uma aula ao ensino não superior, não possam (ou melhor, não devam, porque poder podem tudo) dizer que eu sou contra a avaliação dos professores.

As editoras espreitaram o furo e aí estão elas a apresentar os seus materiais de apoio para a avaliação dos professores. Livros e livros com grelhas e grelhas. É só comprar...
E a procissão ainda vai no adro...

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Aberta a época da caça ao caloiro

Todos os anos, por esta altura, se reacende a minha preocupação ao ver aproximar-se a altura das “praxices”.

Em Setembro de 2003 escrevia eu numa crónica:
“Um novo ano escolar começou. E com ele há mais uma montanha de caloiros. Caloiros que vão ser aliciados para colaborar com a estupidez da praxe. A praxe foi uma tradição coimbrã, quando Coimbra era uma pequena cidade estudantil. Tudo o resto eram toscas imitações. Hoje em dia a praxe está deslocada, não tem qualquer justificação, é estúpida e selvagem. Não há razão de espécie alguma que justifique a humilhação de pessoas. Pôr os caloiros a quatro, feitos animais, a dizer obscenidades, colocar-lhes bosta na cara, obrigá-los a tirar a roupa ou a simular actos sexuais, mergulhá-los em tanques públicos são algumas das idiotices que os alunos mais velhos fazem aos caloiros. Mais grave. Fazem-no com orgulho e ainda acham graça. Não é assim que se inserem os novos alunos no novo mundo que os espera. O que se passa é perfeitamente lamentável.”

Os bandos com que já me cruzei e a televisão mostraram-me que as praxes começaram e a idiotice e grosseria dos praxistas, com idade para ter juízo, e muito deles idade para trabalhar, se mantêm. Com o pretexto da integração dos caloiros, os mais velhos sentem-se no direito de penalizar os caloiros que se recusam a ser praxados, impedindo-os de um dia se vestirem de zorros. Quem são estes galfarros para punir um(a) colega? Normalmente são os cábulas. Os que lá andam a gastar o nosso dinheiro. O dux já devia estar, há muitos anos, a trabalhar e a contribuir com os seus impostos para as necessidades das Universidades onde entram aqueles que ele anda a praxar.

Às palavras de uma caloira “Não sofram, não se deixem humilhar só porque têm o sonho da capa. Não se deixem enganar. A capa preta não vos dá mais dignidade”, eu acrescentaria. Não vão em carneiradas. Sejam capazes de dizer não. E não se esqueçam que, até hoje, nunca ninguém foi penalizado pelos actos que originaram problemas, alguns dos quais bem graves.

O Dr. Pacheco Pereira escreveu há muito tempo, a propósito das praxes, que “cada vez mais a única coisa que os estudantes transportam do liceu para a universidade é a sua carga de ignorância”. Não podia estar mais de acordo. Só isso justifica que, simultaneamente, se encantem e amedrontem com os mais velhos e não tenham a coragem de dizer não à praxe. Os mais velhos só têm mais do que os caloiros uma coisa – a idade. E mais idade, infelizmente, nem sempre corresponde a mais responsabilidade.

sábado, 27 de setembro de 2008

Pobre Fernão de Magalhães!

Fernão de Magalhães foi um português determinado, nascido em Trás-os-Montes, na segunda metade do século XV, que preparava as suas estratégias “como passos de dança”. “Dominava, como poucos, as técnicas de navegação. Isso levou-o a projectar uma viagem espantosa, que respondeu à grande questão da época: saber se a terra era esférica ou não”.
Participou na conquista de Malaca sob o comando de Afonso de Albuquerque, em 1513, e em 1519 inicia a primeira viagem de circum-navegação. Chegou à baía de Guanabara, alcançou a foz do Rio de Prata, passou na baía de S. Julião, desembocou no Pacífico, descobriu a ilha dos Ladrões e o arquipélago das Filipinas, onde morreu em combate.

Um português destes não merecia a “fantochada” que foi feita com os computadores, aos quais foi dado o seu nome, e que uma dúzia de governantes andou a distribuir por esse país fora.

Vamos primeiro às cenas que vimos e às que não vimos na televisão. O que vimos foi um alarido tal que só se justificava se o Fernão de Magalhães tivesse acabado de concluir a viagem de circum-navegação agora. Vimos um governo inteiro fechar “o tasco” para se passear pelo país fora numa acção de total e absoluta inutilidade. Os Directores Regionais, ou os próprios Conselhos Executivos das escolas podê-lo-iam ter feito.
Agora o que não vimos. Na escola de S. Mamede de Infesta, além do primeiro-ministro, estavam os operadores das redes móveis. Tudo acabado, faltava desmontar as tendas. Os operadores foram informados que tinham de esperar que o PM falasse e ele só falava às 13 h para entrar em directo nos telejornais. A P. telefonou-me indignada. Queria vir-se embora, precisava de almoçar, queria continuar o seu dia de trabalho e estava impedida de o fazer por causa da propaganda eleitoral do PS. A isto eu chamo falta de respeito pelos cidadãos que trabalham e que, ainda, não são obrigados a colaborar em festas eleitoralistas.

Agora falemos dos Magalhães computadores. Para que querem as crianças do primeiro ciclo um computador pessoal? Para jogar. Será isso tão educativo que mereça este investimento e este despropósito? Mais. Todas essas crianças já têm acesso aos computadores da escola e muitos deles têm-no em casa. Já estive, vários anos a dirigir a sala de estudo da escola onde lecciono. Contavam-se pelos dedos das mãos os alunos que recorriam aos computadores para trabalhar. Os jogos e a página do Futebol Clube do Porto eram a procura maioritária.

Enquanto se oferecem computadores a eito, na minha Área Disciplinar somos 12 professores e temos 1 (um) projector multimédia. É ver quem chega primeiro e o apanha. Que me interessa ter no meu portátil uma simulação, um programa, uma página interessantíssimas para os alunos, se chego à escola e não o posso mostrar porque outro(a) colega já “arrebanhou” o projector multimédia?


Pergunto eu. Não seria muito mais útil investir este balúrdio que foi gasto, do propagandeado plano tecnológico, no apetrechamento das escolas? Computadores têm as escolas em número mais que suficiente para todos os alunos que o não têm em casa.

Mas, para o cidadão ignorante (a maioria), apetrechar as escolas não lhes entra pela casa dentro. Não vêem como uma mais-valia. E os pais correspondem a muitos, muitos votos.
Haja paciência para tanta ignorância de uns e tanta hipocrisia dos outros.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Sarcasmo

Vi e ouvi uma pequena parte do debate na Assembleia da República.

Estou a acabar de ler um livro de Julian Barnes que, num dos contos de "A mesa limão", diz que o sarcasmo é uma fraqueza moral. Foi o que eu vi no sorriso do nosso primeiro...

sábado, 20 de setembro de 2008

Fica o aviso

Após oito dias do início das aulas, continuam as visitas de altas figuras do Governo às escolas numa pura encenação de propaganda eleitoral. Quem assim age está obsessivamente empenhado em tentar compensar reformas erradas com uma estudada boa figura perante o país, através dos órgãos de comunicação social.

Sou adepta confessa da valorização do mérito. Mas do mérito mesmo. Não considero digno de mérito "ter um olho em terra de cegos". As escolas têm o seu “Quadro de Honra” e há Instituições como os Lions ou os Rotários que atribuem prémios aos melhores alunos das escolas da sua área. Absolutamente de acordo desde que as escolas não atribuam mérito a todos que têm uma média superior a um valor estipulado. Isso é tirar mérito ao mérito.

Institucionalizar o “Dia do Diploma” já me parece exagero. Os alunos que têm possibilidade de frequentar o 12º ano, não fazem mais do que a sua obrigação em conclui-lo. Fazem aquilo que devem fazer – trabalham. Não têm nisso mérito algum. Daí que considere fantochada, a entrega pelo Primeiro-ministro dos diplomas de fim de ciclo a tantos jovens. Com tantos problemas com os quais o país se debate, pensava eu que o PM teria mais que fazer do que andar a calcorrear o país, de escola em escola, acompanhando a Ministra da Educação.

A “atribuição dos Prémios de Mérito Ministério da Educação, criados com o objectivo de distinguir, em cada escola, o melhor aluno dos cursos científico-humanísticos e o melhor aluno dos cursos profissionais, tecnológicos ou do ensino artístico especializado” serviu para dar ao Governo mais uns largos minutos de antena. Pura campanha eleitoral. (Sobre estes prémios ainda me debruçarei numa próxima oportunidade já que não é tão linear como consta na página do Ministério).Pura propaganda eleitoral foi, também,a entrega de livros aos mais pequenos. Areia que atiram para os olhos dos portugueses que ainda se deixam levar por estas coisas. Uma jornalista de um canal televisivo referia a pertinência da entrega de livros num país onde um em cada dez portugueses são analfabetos.

Não tenho a pretensão de fazer ver o que se passa nas escolas a quem não vive o dia a dia de uma delas. Já desisti. Os fazedores de opinião (que nunca estiveram ligados ao ensino não superior mas são pagos para falar do que não sabem) já “construíram” a cabeça de muitos portugueses. Mas, com 36 anos de sala de aula, sinto-me no dever e com o direito de deixar um aviso. Este Governo sempre disse que era urgente qualificar os portugueses, nunca disse que era preciso prepará-los para algo. Portanto, está a cumprir esta promessa (deve ser a única). Está a qualificar aos milhares. Veja-se como esta senhora fez 4 anos em cerca de 25 horas.

Deixem continuar estas “reformas” que daqui por uma dezena de anos teremos 8 em cada 10 cidadãos analfabetos... mas qualificados. Os 2% que retirei referem-se aos que têm famílias com nível cultural e económico que lhes permite proporcionar aos seus filhos um ensino de qualidade e exigência.


Quem viver verá.
Eu espero estar cá para assistir ao povo a dizer “o rei vai nu”.
Fica o aviso.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

AS ACND

Tenho na minha mão a cópia do ofício que seguiu ontem para a Caixa Geral de Aposentações e que diz:"A pedido da subscritora acima referenciada, somos a enviar requerimento de aposentação."

Não queria acabar assim a minha carreira. Dediquei-me demasiado e demasiados anos para me ver forçada a “fugir” da profissão que escolhi e da qual gostei muito. Mas esta equipa governativa não me dá alternativa. Transformaram-me em burocrata e o tempo que me dão para ser professora é insuficiente para exercer a profissão com a qualidade com que me orgulho de sempre o ter feito. Os fazedores de opinião, tipo Miguel Sousa Tavares, Emídio Rangel, Manuel Ribeiro e tantos outros trataram-me como a mais vil das criaturas. A Confederação Nacional das Associações de Pais, na voz do senhor Albino Almeida, também me ofendeu variadas vezes. A Ministra chamou-me publicamente professorazeca e foi o menor dos insultos. Gente desta não merece o que eu fiz pelo país que é de todos. Ficam eles. Eu vou. Atingi a exaustão.
Resta-me a consolação de ter ajudado a formar verdadeiros cidadãos que, depois de décadas, ainda me contactam e querem a minha assinatura nas fitas da sua pasta. Por eles, e apenas por eles, não dou o tempo por perdido.

Hoje vou ter uma reunião de professores que leccionar a Área de Projecto. Eu tenho essa área curricular não disciplinar (ACND) numa das turmas do oitavo ano.
Para a reunião foram-me enviados, para além da convocatória, 14 (catorze) documentos. A ver:
Grelha de Observação, Grelha de Avaliação, Ficha de Avaliação de Grupo, Ficha de Auto-Avaliação, Ficha de Avaliação Intermédia, Planificação das disciplinas intervenientes, Planificação Geral, Planificação de Grupo, Temas sugeridos, Projecto do Clube de Protecção civil do meu estabelecimento de ensino, Documentos com todas as etapas do trabalho de projecto, Despacho nº 19308 de 21 de Julho de 2008, Nos trilhos da Área de Projecto (documento com 14 páginas) e a lista dos docentes que irão leccionar a dita ACND.

Tudo isto me é enviado por mail, pelo que sou eu que imprimo toda esta “tralha” com impressora, papel e tinta que pago do meu bolso e que continuarei a pagar cada vez que me pedirem grelhas ou fichas preenchidas.

Mas eu sou professora da disciplina de Ciências Físico-Químicas, uma Área Curricular Disciplinar (ACD). Para esta disciplina eu tenho aulas para preparar, planificação anual e planificação para os encarregados de educação, grelhas para correcção de testes, grelhas para correcção de fichas de trabalho, grelhas para a avaliação sistemática na sala de aula, grelhas de observação para as aulas práticas e sei lá que mais. Ou bem que dou aulas como deve ser ou bem que preencho papelada.

Para terminar quero deixar aqui a lista das áreas curriculares, disciplinares ou não, que esta turma de miúdos do oitavo ano tem. Língua Portuguesa, Inglês, Francês, História, Geografia, Matemática, Ciências Naturais, Ciências Físico-Químicas, Educação Visual, Expressão Artística (um semestre), Educação Tecnológica (um semestre), Educação Física, PAM (Plano de Acção da Matemática), Formação Cívica, Estudo Acompanhado, Área de Projecto e Educação Moral e Religiosa Católica (facultativa). Contem-nas… eu vou para a reunião.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Que seria de nós sem o simplex?

Tenho um casal amigo que teve um jovem familiar a estudar na Dinamarca. Estiveram lá algumas vezes e um dia disseram-me: “Nunca vás à Dinamarca. Certinha, honesta, metódica e arrumada como és, de certeza que não regressas”. Vem isto a propósito de um episódio que vivi há minutos.
Fui aos serviços administrativos da minha escola entregar um documento necessário para completar o processo do pedido da reforma. Por lei podia pedi-la no dia 14 de Setembro. Como calha num domingo, seria espectável que o processo seguisse na segunda-feira, dia 15. Seria se eu estivesse na Dinamarca... O impresso que acompanha o processo tem que ser preenchido on-line. Depois de assinado por quem de direito, é anexado ao processo e enviado à Caixa Geral de Aposentações.
Mas o simplex tem coisas que nem ao diabo lembram. O impresso não aceita, no preenchimento on-line, a data do dia mas apenas a da véspera. Sendo assim, não pode ser preenchido no dia 15 porque a véspera é domingo e o computador não aceita. Terá de ser preenchido no dia 16 para figurar a data de 15.
Tudo isto num país onde, segundo li, o nosso primeiro se “licenciou” num domingo.
Neste país de filhos e enteados, os filhos são cada vez mais filhos e os enteados são cada vez mais enteados.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Roubar legalmente

Apresentei-me hoje ao serviço após as férias a que a lei me dá direito. Mas não pensem que chego ao serviço e começo a trabalhar. Não. Tenho de pagar para recomeçar o meu serviço após as férias. Sou obrigada a comprar, sem recibo, um impresso (cinco cêntimos, paguei hoje), do Ministério da Educação, que preencho. Só após a entrega desse impresso preenchido, eu estou efectivamente ao serviço.

Todos os anos é isto. Pago para ir trabalhar. E pago porque uma lei estúpida a tal me obriga. Mas pago sob protesto. E se tiver dois períodos de férias, são dois os impressos que compro, sem recibo.

Acho inaceitável ter de pagar para retomar o serviço depois das férias ou de um atestado médico. Quanto aos atestados, os que entreguei numa vida inteira de trabalho, não ultrapassaram a meia dúzia. Mas férias, gozo-as todos os anos.

A quantia em causa é insignificante mas o princípio, francamente, acho inadmissível. Tudo serve para nos roubarem dinheiro cujo destino nenhum de nós conhece pelo que temos o direito de fazer as nossas suposições. E, se multiplicarmos os 50 cêntimos por milhares de professores todos os anos, já dá uma quantia bastante razoável.

Será que os ministros e afins também compram um impresso para retomar o serviço?
É o país que temos. O Governo não aparece encapuçado, não vem armado mas rouba da mesma maneira. Oferece a si mesmo as leis que lhe permitem roubar legalmente.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Os pequenos déspotas

Em cada ano lectivo que começa, e está mais um a começar, a minha desmotivação é maior. Sinto-me cada vez mais sem chão nesta sociedade onde o desmoronar de valores chegou ao limite. A instrução que deveria ser dada na escola não faz sentido sem antes ter havido a educação que pertence aos pais e à sociedade. Porque resumir educação a instrução é extremamente limitativo.

Que valores transmite esta sociedade às crianças e aos jovens? Os jovens nascem e crescem numa sociedade onde grassa a mediocridade. Onde o sucesso não está associado ao trabalho. Onde todos se sentem cheios de direitos mas muito poucos olham para os seus deveres. Onde a exigência é uma palavra vã. Onde não compensa ser cumpridor. Onde quem não cumpre, se gaba de o não fazer. Onde o crime compensa desde o atestado médico falso ou da fuga aos impostos à irresponsabilidade dos políticos. Os exemplos que as crianças e os jovens vêem à sua volta são lamentáveis e não são minimamente educativos.


Ouvimos os empregadores queixarem-se da falta de preparação dos recém licenciados. Os professores do superior sacodem a culpa para os do secundário. Os do secundário para os do básico. Os do básico para os do primeiro ciclo. E, possivelmente, estes para os pais. Todos têm razão e todos fazem parte do problema e da solução.


O que se tem investido na educação nos últimos 30 anos não tem resultado. Mudar programas e currículos não tem sido mais do que desperdiçar dinheiros públicos. É preciso mudar pessoas. Professores, pais, alunos e políticos. Depois do 25 de Abril, assumiu-se que tudo traumatizava as crianças e os jovens. Em casa e na escola. Passaram a ser tratados como uns seres esquisitos susceptíveis a traumas pela mais pequena coisa. Nada lhes pode ser exigido mas eles podem exigir tudo. A palavra não deixou de fazer parte do vocabulário dos pais. Aqueles que ainda ousam pronunciar essa palavra, rapidamente a transformam num nim e depois num sim ou num silêncio permissivo. Quem manda em casa são os filhos. Os pequenos déspotas. Não se lhes ensina que há tempos de trabalho e tempos de lazer. Tudo para eles tem que ser a brincar. As novas pedagogias assim o determinam. As aulas não deviam ser tempos de lazer mas momentos de trabalho. Trabalho sério. A geração do pós 25 de Abril não aprendeu nem conteúdos programáticos nem a mais elementar cultura geral. A geração que hoje anda na casa dos trintas. Geração dos novos pais, dos novos professores, dos novos políticos.
Os portugueses não dão valor à aprendizagem. Toda e qualquer aprendizagem. As estatísticas mostram que metade dos portugueses não quer qualquer formação ao longo da vida. As crianças crescem a ver e viver isso. Crescem também a não dar valor a nada. Tudo o que têm é-lhes dado. Aparece. Sem mais. Quando chegam à escola querem uma aprovação ou uma determinada avaliação sem terem feito o esforço necessário para a conquistar. Em casa têm a televisão, os DVDs, as playstations a que recorrem quando lhes apetece sem qualquer limitação ou regra. Não são habituados, desde pequeninos a ter hábitos de disciplina, de esforço, de trabalho. Sem uma educação exigente não se formam cidadãos competentes. E com cidadãos incompetentes não pode haver uma educação exigente. Estamos num círculo vicioso.


Quando eu era miúda, havia uma prenda no Natal. Uma. À qual se dava um valor incomensurável. Durante meses o brinquedo era explorado até à exaustão. Hoje as crianças têm tantos brinquedos que se limitam a rasgar o papel de embrulho e pôr para o lado para rasgar o papel da próxima que voltam a pôr para o lado.


Comprava-se uma pasta de couro que durava toda a primária. Hoje têm – exigem – uma mochila, no mínimo, por cada ano escolar. E todo o material escolar tem que ser de uma determinada marca, mais cara evidentemente. Os portugueses não têm a noção das prioridades. Desde o mais humilde cidadão ao mais conceituado membro do Governo. Os pais deviam explicar às crianças, desde pequeninas, que se tem o que é necessário e não o que se quer.

Tantas vezes fico estupefacta ao ver a maneira como as crianças e os jovens tratam os pais. Não os respeitam possivelmente porque eles não lhes incutiram a noção do respeito pelos outros. Como não lhes incutem o prazer pelo saber. A grande maioria dos jovens não tem interesse pelo saber. Não manifesta qualquer curiosidade intelectual. Quer apenas passar. Querer esse que é partilhado pelos pais.

Para não ficarem comprometidas as gerações futuras era necessário agir já. Exigindo de todos. Todos mesmo.

(Adaptação de uma crónica publicada em Setembro de 2004)

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

A ida à urgência

Felizmente a minha saúde tem-me poupado a idas às urgências dos hospitais públicos. São locais que me deixam em pânico essencialmente pela desumanização que sei que vou encontrar como já encontrei quando tive uma filha internada com uma gravidez de risco que, depois de muitos maus momentos, acabou bem. Ontem lá tive que ir à urgência do hospital da minha residência. O tempo de espera até à chamada para a triagem foi bastante razoável. Às 11:39 h, com uma pulseira verde, lá fui enviada para outra sala de espera onde estava este enorme quadro na parede.
Como não estava muita gente (e eu sou inocente nestas coisas, felizmente) pensei que os 120 minutos de espera eram um exagero. Entretanto começaram a entrar pulseiras amarelas umas atrás das outras. Lá passavam à frente, chamados por vozes brasileiras e espanholas. E eu a vê-las passar. O ar condicionado estava fortíssimo e eu já tiritava esticando, em vão, as mangas curtas da camisa. Os 120 minutos passaram e resolvi telefonar a uma das filhas para me levar lá um casaco quente, um livro para ajudar a passar o tempo, uma garrafa de algo que se bebesse e umas bolachas para não cair redonda de frio e fome. Lá vesti o casaco de lã, bem quente, e alimentei minimamente o físico. Às 17 h, a médica brasileira acabou por chamar o meu nome, fez o diagnóstico, medicou-me logo e mandou-me embora com uma receita para aviar. Às 17:45 h voltei, finalmente, a ver a luz do dia. Conclui, então, que “tempo alvo” significa “tempo mínimo”. Estamos sempre a aprender.

Já não temos médicos portugueses para nos atenderem nas urgências. Estamos agora e pagar o resultado da contínua cedência à classe profissional que mais lutou pelo seu feudo. E que sempre o conseguiu. A contínua limitação das entradas para medicina, tinha que ter o seu preço e cá estamos nós a pagá-lo.
Começou a aumentar a procura da língua espanhola para os nossos jovens irem tirar o curso de medicina em Espanha. E os médicos portugueses têm os seus postos nos hospitais públicos em part-time e os seus lucros chorudos nos consultórios no outro meio tempo. A classe médica foi sempre muitíssimo favorecida. É a única que tem o seu emprego garantido no final do curso e a que tem aumento de ordenado se optar por trabalhar em regime de exclusividade. Algo que foi muitíssimo útil (não sei ainda assim é) para passar uma vida inteira a trabalhar no público e no privado e, a meia dúzia de anos do fim da carreira, pedir e exclusividade para garantir uma maior reforma.


Em 2004, a Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior sugeriu que o acesso a todos os cursos de Medicina e Medicina Dentária públicos fosse sujeito a uma prova nacional de acesso cujo peso na nota de candidatura ao ensino superior será de 50%. Depois de testada essa ideia foi, pura e simplesmente abandonada. Perguntei a um aluno meu que estava em medicina (depois de ter concluído o curso de enfermagem) o que pensava dessa prova “Concordo e acho que uma prova como essa devia existir para todos os cursos. Era uma garantia que entravam os melhores para a área específica a que se candidatavam. No entanto na experiência feita, a média nacional andou à volta de 7. Por uma questão de imagem não querem implementá-la. A média de acesso a Medicina passava a ser mais baixa do que muitos outros cursos. Eu acho que para o acesso a cursos da área da saúde era necessário, além de uma prova que testasse conhecimentos, a realização de provas, isentas e transparentes, que avaliassem as qualidades humanas do candidato. Não nos podemos esquecer que nestes cursos trabalhamos com pessoas. Pessoas que, ainda por cima, estão fragilizadas. É a saúde das pessoas que está em jogo.” Que bom seria se houvesse muitos médicos a pensar assim!

Os médicos são imprescindíveis mas Deus nos livre de precisar deles.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Os milagreiros

Maria de Lurdes Rodrigues conseguiu o milagre fácil de transformar alunos que nada sabem de Matemática, em génios matemáticos. Mandou elaborar provas que até os mais ignorantes conseguissem fazer. Foi o milagre da multiplicação das avaliações.

Agora é a vez de José Sócrates fazer o seu milagre.
“O primeiro-ministro acredita que o actual Governo vai conseguir concluir a promessa de criar 150 mil novos postos de trabalho até ao final do mandato, tendo em conta que desde Março de 2005 até agora houve criação líquida de 133 mil empregos, afirmou hoje José Sócrates, nas primeiras declarações após o regresso de férias.” – escreve o Público.

Detesto que me tomem por parva e esta rentrée do primeiro-ministro vai nesse sentido. Todos sabemos que o desemprego está muito maior do que quando este Governo tomou posse. Fábricas a fechar ou a despedir pessoal são aos montes. Licenciados nas caixas dos hipermercados, a conduzir táxis, … são inúmeros. E não vale a pena continuar porque todos os que não fazem parte do Governo conhecem a realidade do país.

Ou os postos de trabalho são "líquidos" (como diz a notícia) e escorregam pelos dedos ou o milagre é tão simples quanto isto: se eu despedir 40 trabalhadores e arranjar emprego para 30, consegui criar 30 postos de trabalho.

Valham-nos os Santos milagrosos a sério!

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Até breve

Estarei ausente uns dias.
Boas férias ou bom trabalho, conforme for o caso.

O jornalismo que temos

Ontem assistimos pelas televisões a uma história de terror ao vivo. Dois criminosos mantiveram como reféns, durante horas e horas, dois portugueses que estavam no seu posto de trabalho. Uma situação perfeitamente inaceitável que foi, a meu ver, muito bem gerida pela polícia. Felizmente acabou com os inocentes a salvo.
Mas não quero falar do caso. Apenas lamentar a maneira como as televisões acompanharam o caso. Horas e horas de emissão. Repetição exaustiva das mesmas informações. Descrição pormenorizada de pormenores sem interesse absolutamente nenhum. A cor das luvas, do calçado, sei lá... dos assaltantes! Entre frases o irritante ammm ammm para entreter que o texto não dá para mais de dois minutos. Um voyerismo bacoco. Lamentável.


Lembrei-me de um artigo com que me deliciei em 2004 e que não resisto a deixar aqui. Com um humor delicioso, Joaquim Fidalgo, fala-nos de um jornal que, por acaso era da TVI, mas podia ser de qualquer outra estação televisiva.

Que É do Terço?...

O caso é sério: alguém roubou o terço da santinha de Balazar. Exactamente. O terço. Não um terço qualquer. O terço da santinha. Da santinha de Balazar. Roubado, o terço. Surripiado. Subtraído. Levado. De Balazar. Da casa da santinha, da sua própria casa. Por estes dias, talvez num domingo.
O caso é sério, já se vê. Tão sério que chegou ao Jornal Nacional da TVI, como podia não ter chegado?..., ao principal noticiário do dia, ao telejornal de maior audiência, no período de maior audiência, no "prime time", que é como se chama àquela meia dúzia de horas em que podemos assistir a uma telenovela, depois a outra telenovela, depois a uma série de pequenas telenovelas (sim, há quem lhe chame "Jornal Nacional", mas isso é do hábito...), depois a outra telenovela e depois a outra telenovela. E chega, que já passa da meia-noite, acabou o "prime time", é altura de dar um filme qualquer, senão a gente nunca mais vai dormir.
Mas o terço, então. É. Roubaram-no. O terço da santinha de Balazar. Não foi da santinha da Ladeira, não senhor. Nem da santinha de Arcozelo. Foi mesmo o terço da santinha de Balazar. O autêntico. O único. O dela. Eu sei, porque a TVI contou-me tudo tintim por tintim. No Jornal Nacional. Não foi a primeira notícia do dia (e por que não?...), mas também não foi a última, sim, que eu bem sei, o dito telejornal começou às oito e ainda não eram nove quando deu a reportagem do terço roubado, portanto ainda as notícias iam a meio, elas que agora, na TVI, vão sempre além das nove e meia, chegam quase às dez, às vezes até atrasam a telenovela seguinte, mas paciência, os senhores não têm culpa, acontece sempre tanta coisa todos os dias, tanto terço roubado e assim, tanto acidente na estrada, tanto pai que bate ao filho e tanta filha que bate à mãe, tanta casa sem água e tanta rua sem passeio, tanta abóbora de dez quilos e tanto peixe sem espinhas, sei lá, o ror de coisas que acontecem cá pela terra e que é preciso noticiar no Jornal Nacional, e isto para não falar do que acontece lá fora, sim, que o mundo lá fora também interessa, não é só por cá que os filhos batem nos pais e as mães batem nas filhas, não, coisas dessas acontecem em todo o mundo e é preciso noticiar.
Mas o terço, o terço, o terço é que não me sai da cabeça. Roubaram-no. O terço da santinha. Da santinha de Balazar. Eu vi tudo, foi lá o repórter e contou, e mostrou, e entrevistou, e fez voto de que tudo se resolva em breve, que o ladrão tenha um rebate de consciência e lá vá devolver o terço, oxalá, ele que deve andar com remorsos porque "a santinha sabe quem foi", lá dizia uma senhora, "a santinha vê tudo", é quase como nós a ver a TVI, também vemos tudo, dentro e fora das casas, dentro e fora da vida da gente, até vemos o terço, não, o terço não vimos, mas só porque o roubaram, essa é que é essa. Mas havemos de o ver, o terço, quando ele voltar. Eu, por mim, estou à espera. E, como eu, centenas. Milhares. Milhões.
Era bom que a TVI me fosse mantendo informado sobre o assunto.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Já lá vai o tempo...

Fui visitar o Museu da Carro Eléctrico, no Porto, que, inadmissivelmente, não conhecia. No sarrabiscos podem ver as fotografias de eléctricos desde 1872.
Além dos veículos, o Museu tem as fardas dos motoristas e revisores, os bilhetes da época, instrumentos vários e as instruções fornecidas aos funcionários.
Essas instruções estão aqui. Peço desculpa pela qualidade das fotografias mas os documentos estão envolvidos em plástico e dentro de estantes de vidro. De qualquer maneira dá para ler.

A sensação foi de nostalgia e de perda.
Nostalgia por ver, como objecto de museu, tanta coisa que conheci com "vida própria". Perda por ler palavras que, infelizmente, sairam dos dicionários dos portugueses: discreto, atencioso, zeloso, correcção, bom senso, delicadeza, respeito, paciência, bons modos, simpatia, ajuda, ...
"... manchar a reputação do STCP." A preocupação de incutir nos trabalhadores do STCP o respeito pela reputação da empresa é espantosa. Onde é que uma empresa, hoje, exige aos seus funcionários semelhante coisa? Os funcionários estão-se "nas tintas" para a empresa e os empresários estão-se "nas tintas" para os seus funcionários. Vive-se exclusivamente para o "ter".

Ontem, à vinda de Barcelos, vinha a ouvir a TSF no rádio do carro. Ouvi uma entrevista com o visconde de "qualquer coisa" sobre o livro "Sermão ao meu sucessor". Lamentava o referido senhor, a perda de alguns valores dos quais ele salientou o "bom gosto" e o "bom senso". Eu acrescentaria a "boa educação" (não instrução, que essa está morta; falta enterrar). A família, primeira responsável pela educação, é uma instituição em crise profunda. Nem sei se em extinção... Revezes do progresso...

quinta-feira, 31 de julho de 2008

Para que servem 230 deputados?

O Presidente da República falou ao país. Não me apetece fazer comentários a essa intervenção embora me apetecesse dar a independência aos Açores e à Madeira para não nos incomodarem mais e fazerem os "lindos" com o seu dinheiro e não com o nosso.
Mas houve algo que me começou a fervilhar na cabeça. O diploma da discórdia tem uma série de inconstitucionalidades. Assim o disse o Tribunal Constitucional que deve ser credível. Digo eu...

Os duzenta e trinta deputados da Assembleia da República aprovaram este diploma por unanimidade. Sim. Disse a comunicação social. Unanimidade. Agora pergunto. Que fazem duzentos e trinta deputados, que na sua maioria são advogados? Não deveriam eles perceber de leis? Não deveriam eles ler os documentos antes de se pronunciarem sobre eles? Não deveriam eles detectar as inconstitucionalidades? São 230 seres pensantes, digo eu...

Isto não vai lá. Mesmo. O nosso futuro está entregue a esta gente.

Deve ser por estas coisas que se diz que a função pública está cheia de incompetentes...
Na sequência do que escrevi ontem, será que os duzentos e trinta deputados estão à espera de ver os seus vencimentos substancialmente aumentados para serem competentes?

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Gestores e remunerações

Em 2001 ficámos de tanga. Já lá vão sete anos. Mandaram-nos apertar o cinto. Mais e mais. Continuamos de tanga e sem vislumbrar o dia em que vamos poder desapertar o dito cinto. Os funcionários públicos viram os seus vencimentos congelados e, quando viram aumentos, foram sempre inferiores à inflação. Estamos a perder poder de compra todos os anos. Os meses são cada vez mais compridos. Está difícil chegar ao fim do mês sem dívidas. Quando se chega. Mas nestes anos todos o que vemos? Que o fosso entre ricos e pobres é cada vez maior. E dizem-nos que isto é socialismo.

Do que nós temos poupado, o Estado “deu” 27 milhões de euros, em 2007, a gestores públicos. E, depois de proclamar aos sete ventos que o número de funcionários públicos é exagerado, o Ministro das Finanças admite que o número de gestores públicos aumentou. Afinal estamos a ver quem aumenta os funcionários públicos. E logo os que são pagos a peso de ouro! Os que ganham dez vezes mais que os seus equivalentes alemães! 349 mil euros foi o custo médio por administração. Quantas dezenas de anos um português médio terá que trabalhar para auferir essa quantia? Esses gestores públicos podem ser competentes mas não estão nos lugares pela sua competência. Alegam-me que para se exigir competência tem que se remunerar convenientemente. Então, eu e tantos portugueses que ganham mal, podemos dar-nos ao luxo de ser incompetentes.


Julgava eu, na minha ingenuidade, que ser competente era a obrigação de qualquer trabalhador. Gestor, electricista, economista, médico, padeiro, professor, político…
Afinal ando enganada há mais de meio século. Para se ser competente é preciso ganhar muito, muito dinheiro. Que estúpida tenho sido! A levar a minha profissão tão a sério para ganhar uma miséria. E há quem ganhe muito menos do que eu! Este país não merece os portugueses trabalhadores honestos e competentes que tem. Como diria o meu pai “é dar pérolas a porcos”.

Enquanto continuar a haver cidadãos, amigos dos governantes e colocados em locais estratégicos, que autodefinem o seu vencimento, não me falem em socialismo.

domingo, 27 de julho de 2008

Derrapagem da Ponte Europa

O Tribunal de Contas disse, em 2004, que a obra da Ponte Europa, hoje Ponte Rainha Santa Isabel (?) foi adjudicada por 38,65 milhões de euros. A obra ficou em 111,3 milhões", o que representa uma derrapagem de 288%.
António Laranjo, o anterior presidente da Estradas de Portugal propôs, no ano passado, ao Governo que arquivasse o processo de apuramento de responsabilidades pela referida derrapagem. O Governo diz, agora, que "Não se afigura desejável nem adequado o arquivamento do processo".

O IEP, apesar de dispor de relatórios do Tribunal de Contas, da Inspecção Geral das Obras Públicas (IGOP) e de uma sociedade de advogados que já indiciavam responsabilidades, nunca retirou as devidas consequências. Os documentos criticam decisores políticos, projectistas, o consórcio Somague/Novopca e o dono da obra - JAE, ICOR e IEP. O IGOP considera "um caso exemplar de como não promover, projectar e construir uma obra pública".

No entanto, eu concordo com António Laranjo. Arquive-se. Para quê investigações? Os portugueses pagam a ponte, que isso sim, acontece sempre e deixemo-nos de teatros. Para quê gastar dinheiro se, todos sabemos, neste país a culpa morre sempre solteira? Ou já alguém viu algum decisor político, projectista, Somague/Novopca, JAE, ICOR e IEP ser condenado?

sábado, 26 de julho de 2008

O concelho do nosso primeiro

Diz-se que há um exagerado número de funcionários públicos. Se calhar há. Mas uma coisa é certa. Nenhum funcionário público aparece no seu posto sem mais. Ou concorreu a um concurso e foi admitido (caso dos funcionários públicos de mais baixos salários) ou o pai, o padrinho, o cunhado, o amigo… está no Governo, numa Câmara, numa Instituição e “dão o jeito” de os por lá a ganhar bem. A cunha é a mais sólida Instituição portuguesa e a única que se mantém sempre a funcionar maravilhosamente apesar das mudanças contínuas de equipas governativas.
Assim, os funcionários públicos que existem, existem porque os Governos assim o entenderam. Os mesmos Governos que dizem que o número é exagerado. Mas, há um estudo que os órgãos de comunicação não fazem (porquê?) que é saber desse número imenso de funcionários públicos, quantos trabalham directa ou indirectamente para o Governo.

Há uns tempos fiz um estudo para o concelho de Vizela que pode ver aqui e hoje debrucei-me sobre o concelho onde nasceu o primeiro-ministro - Alijó. Vamos então:
O concelho tem uma área de menos de 300 quilómetros quadrados (equivale a um quadrado com 17 quilómetros de lado), onde existem 49 povoações, e está dividido em 19 freguesias. É verdade. Para 49 povoações há 19 freguesias. Se olharmos para a área, cada freguesia não chega a ter, em média, 16 quilómetros quadrados (equivale a um quadrado com 4 quilómetros de lado). Um presidente de Junta por cada 800 habitantes.

Cada quintal destes custa-nos um edifício para a junta de freguesia, com todas as despesas que um edifício destes acarreta, e os ordenados do presidente da junta e de todos os que com ele trabalham.
Este concelho é um dos 14 que compõem o distrito de Vila Real que tem de área 4300 quilómetros quadrados. Assim sendo, cada concelho deste distrito tem, em média, a área deste. Ao todo há, no distrito de Vila Real, 277 freguesias. Como no Distrito de Vila Real há 218935 habitantes, temos uma média de uma junta de freguesia por cada 790 portuguesas. Nada mau!

Quantos funcionários públicos trabalham, e ganham, em todas as Juntas de Freguesia dos Concelhos em que nosso pequeno País está esquartejado? Adorava saber.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Pergunto eu

Para construir o TGV, os IPs, os ICs, as auto-estradas e tantas outras obras, que alguém considera (discutivelmente) como prioritárias para uma melhor qualidade de vida dos portugueses, o Governo tem prejudicado cidadãos que compraram, ou herdaram, as suas terras, as suas casas em locais que consideravam seus. Limita-se a expropriar os terrenos que precisa, sem qualquer preocupação de lhes oferecer compensações por essa perda inesperada e irreparável.

Por que razão apregoa agora uma série imensa de compensações aos cidadãos do Oeste pelo facto de o projecto do aeroporto ter passado da OTA para Alcochete?

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Portugal e os ciganos da Quinta da Fonte

O caso dos ciganos da Quinta da Fonte já me nauseia. E o tempo de antena que os órgãos de comunicação social dão àquelas pessoas, também. Ainda hoje o Presidente da Câmara de Loures dizia que a edilidade não tinha dinheiro para lhes dar outra casa e que havia mais gente necessitada. Já lhes demos, com os nossos impostos, uma casa, eles querem outra e ainda parece que estamos a pedir desculpa por não lha darmos. Esta minoria é mais do que os outros portugueses que, para terem uma casa, estão a pagar ao banco? Quanto português remediado tem um plasma? Eu não. Eles têm.
E se um cidadão comum se desesntender com um vizinho? A Câmara dá-lhe outra casa? Em local escolhido?

"O homem, jovem, movimentava-se num desespero agitado entre um grupo de mulheres vestidas de negro que ululavam lamentos. "Perdi tudo!" "O que é que perdeu?" perguntou-lhe um repórter.
"Entraram-me em casa, espatifaram tudo. Levaram o plasma, o DVD a aparelhagem..." Esta foi uma das esclarecedoras declarações dos autodesalojados da Quinta da Fonte. A imagem do absurdo em que a assistência social se tornou em Portugal fica clara quando é complementada com as informações do presidente da Câmara de Loures: uma elevadíssima percentagem da população do bairro recebe rendimento de inserção social e paga "quatro ou cinco euros de renda mensal" pelas habitações camarárias. Dias depois, noutra reportagem outro jovem adulto mostrava a sua casa vandalizada, apontando a sala de onde tinham levado a TV e os DVD. A seguir, transtornadíssimo, ia ao que tinha sido o quarto dos filhos dizendo que "até a TV e a playstation das crianças" lhe tinham roubado. Neste país, tão cheio de dificuldades para quem tem rendimentos declarados, dinheiro público não pode continuar a ser desviado para sustentar predadores profissionais dos fundos constituídos em boa fé para atender a situações excepcionais de carência. A culpa não é só de quem usufrui desses dinheiros. A principal responsabilidade destes desvios cai sobre os oportunismos políticos que à custa destas bizarras benesses, compraram votos de Norte a Sul. É inexplicável num país de economias domésticas esfrangalhadas por uma Euribor com freio nos dentes que há famílias que pagam "quatro ou cinco Euros de renda" à câmara de Loures e no fim do mês recebem o rendimento social de inserção que, se habilmente requerido por um grupo familiar de cinco ou seis pessoas, atinge quantias muito acima do ordenado mínimo. É inaceitável que estes beneficiários de tudo e mais alguma coisa ainda querem que os seus T2 e T3 a "quatro ou cinco euros mensais" lhes sejam dados em zonas "onde não haja pretos". Não é o sistema em Portugal que marginaliza comunidades. O sistema é que se tem vindo a alhear da realidade e da decência e agora é confrontado por elas em plena rua com manifestações de índole intoleravelmente racista e saraivadas de balas de grande calibre disparadas com impunidade. O país inteiro viu uma dezena de homens armados a fazer fogo na via pública. Não foram detidos embora sejam facilmente identificáveis. Pelo contrário. Do silêncio cúmplice do grupo de marginais sai eloquente uma mensagem de ameaça de contorno criminoso - "ou nos dão uma zona etnicamente limpa ou matamos." A resposta do Estado veio numa patética distribuição de flores a cabecilhas de gangs de traficantes e autodenominados representantes comunitários, entre os sorrisos da resignação embaraçada dos responsáveis autárquicos e do governo civil. Cá fora, no terreno, o único elemento que ainda nos separa da barbárie e da anarquia mantém na Quinta da Fonte uma guarda de 24 horas por dia com metralhadoras e coletes à prova de bala. Provavelmente, enquanto arriscam a vida neste parque temático de incongruências sócio-políticas, os defensores do que nos resta de ordem pensam que ganham menos que um desses agregados familiares de profissionais da extorsão e que o ordenado da PSP deste mês de Julho se vai ressentir outra vez da subida da Euribor."


(Mário Crespo, JN)

segunda-feira, 21 de julho de 2008

TGV

Estive a jantar com duas das minhas filhas e com quatro dos meus netos. Dei comigo a pensar no Portugal onde viverão estes pequerruchos? O futuro deles está a ser comprometido pela megalomania dos políticos portugueses. Possivelmente o futuro dos filhos deles… e o futuro dos filhos dos filhos deles.

Quando vou a Lisboa viajo no alfa. Em menos de três horas vou de Lisboa ao Porto com toda a comodidade. Nalguns troços o alfa vai a uma velocidade superior e 200 km/h e noutros troços a 40 km/h. Quer isto dizer que o alfa não está a ser rentabilizado. Se o fosse, demoraria duas horas, ou pouco mais a fazer a viagem.

Este Governo insiste no TGV Lisboa – Porto. Um TGV que nos vai custar uma fortuna e, ainda por cima, vai ter mais paragens que o alfa. Como ainda me não explicaram a razão da necessidade do brutal investimento que se vai fazer, sou livre de pensar que seria bem mais sensato e económico arranjar uma linha para o alfa onde este pudesse ter uma velocidade média compatível com as suas potencialidades. Os comboios já nós temos. Estarei a raciocinar mal? Faltar-me-ão dados para equacionar o problema?

Mas isso não era uma obra suficientemente grande para a marca “Sócrates”.
Os países são como os cidadãos. Há os pobres, os remediados, os ricos e os muito ricos. Se Portugal é um país pobre ou, na melhor das hipóteses, remediado, que o seja assumidamente e viva como tal. Tem que aprender a viver com aquilo que tem e deve olhar primeiro para o que são as necessidades primárias do seu povo. Mas de todo o seu povo. Ninguém é mais que ninguém por ter mais bens, mas é mais que muitos se souber gerir bem aquilo que tem.

Agora vejam os TGVs que precisamos.

Daniel Campelo não comprometeu o futuro dos seus munícipes e tem a cidade de Ponte de LIma linda, conservada e com inúmeros eventos que atraem os turistas, nacionais e estrangeiros. Uma terra onde se vai sempre com gosto. O Governo que lhe siga o exemplo e olhe para as nossas reais necessidades onde não está, definiticamente, o TGV Porto - Lisboa.